quinta-feira, 4 de junho de 2020

Racismo Estrutural e Invisível no Brasil

Consulta rápida ao Wikipédia: Homo homini lupus é uma sentença latina que significa: o homem é o lobo do homem. Foi criada por Plauto (254-184) em sua obra Asinaria. Bem mais tarde foi popularizada por Thomas Hobbes, filósofo inglês do século XVIII.

A expressão “o homem é o lobo do homem” pode ter os mais diversos significados. Atrevo-me a dizer que o homem, no alto da sua “superioridade”, por motivos histórico-sociais, acaba por denegrir, ridicularizar, humilhar e tentar diminuir um indivíduo da própria raça.

Após a vitória do Santos diante do Grêmio na quinta-feira última, na Arena Grêmio, em duelo válido pelas oitavas de final da Copa do Brasil, o goleiro Aranha deixou o gramado acusando a torcida gaúcha de racismo. Segundo o jogador, torcedores do Grêmio xingaram de “preto fedido”.

As câmeras de televisão da ESPN Brasil registraram o momento em que os torcedores imitam macaco em coro das arquibancadas para provocar o jogador. O mais curioso é que pelas imagens da TV podemos ver, no grupo de torcedores, várias pessoas negras se manifestando. Além disso, as imagens mostram uma torcedora xingando o goleiro de macaco.

Horas depois, como não podia deixar de ser, a garota foi bombardeada nas mídias sociais com frases do tipo: "é uma vaca", "é uma branquela horrorosa", "é uma desgraçada" bla, bla, bla... e também os próprios gremistas foram vítimas de insultos como: "os homens do sul não gostam de aranha" e bla bla bla. Ou seja, insultos gerando insultos, discriminação racial gerando homofobia, uma verdadeira guerra entre pessoas.

Fatos Recentes

Não é de hoje que estamos vendo pelos noticiários estes lamentáveis episódios no futebol e também em outras esferas da sociedade. Recentemente, a jornalista potiguar Micheline Borges fez um comentário em sua página pessoal no Facebook sobre a aparência de médicos cubanos que chegaram ao Brasil. A postagem ganhou repercussão nacional e fez com que a jornalista apagasse o perfil nas redes sociais.


Para ela, a postagem não foi preconceituosa. Mas a opinião pública logo se espalhou pelas redes sociais. Muitos internautas reproduziram a postagem e fizeram comentários criticando a frase da jornalista, que mesmo assim continuou se defendeu na rede social durante algumas horas.

"Se eu chegar numa consulta e encontrar um médico com cara de acabado ou num escritório de advocacia e o advogado mal vestido vou embora", comparou, antes de encerrar a conta no Facebook.

Se você leitor é negro, tenho certeza que já foi vítima de algum tipo de discriminação racial na vida. Eu não sou negro, mas sou mestiço e tenho muitos parentes que são negros. E a pergunta que não quer calar é: quando este tipo de comportamento irá acabar?

Cada um terá sua resposta a esta pergunta, a minha é: “daqui décadas, séculos ou mesmo milênios quando a raça humana será extinta”. Meu pensamento pessimista vem da minha constatação de que o ser humano está em uma guerra permanente, invisível, velada e subestimada. Sou partidário do pensamento de Hobbes que desmonta o valor retórico da liberdade e da igualdade. Para ele, a igualdade leva à guerra de “todos contra todos”.

No lamentável episódio da partida de futebol, esporte este que vez ou outra transforma os estádios em campos de batalha, dentro e fora do gramado, a torcedora não admite que seu time apresentou menor desempenho no campo e parte para o ataque com a única arma que tem naquele momento: “seu grito inflamado”. Grito este que não é articulado pela razão e sim pela emoção, sendo esta o resultado de anos e anos de distorções sociais introjetadas na sua mente.

Conceituação

"Racismo" é um termo amplo utilizado para descrever variados tipos de crenças e atos que negam a igualdade fundamental de todos os seres humanos, em função da percepção de diferenças de "raça", ascendência, cor ou aparência.

A maioria das pessoas usa a idéia de raça, ou de aparência relacionada à raça, como maneira de identificar a si mesmos ou aos outros. Entretanto, a ciência nos ensina que existe apenas uma raça: a raça humana, ponto final!

A discriminação racial é o racismo em ação: Qualquer distinção, exclusão, restrição ou preferência baseada em raça, cor, ascendência ou origem nacional ou étnica que tenha como finalidade ou efeito anular ou impedir o reconhecimento, gozo ou exercício, em pé de igualdade, de direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social e cultural, entre outros, da vida pública.

História

O racismo, como o percebemos hoje, é algo relativamente recente na história na humanidade. Até por volta da Idade Média, os principais fatores de discriminação eram religiosos, políticos ou referentes à nacionalidade e à linguagem do indivíduo.

No século XV, quando os europeus desembarcaram na África, e principalmente com o início do tráfico negreiro, usaram a ciência a favor do colonialismo e desenvolveram teorias de superioridade evolutiva, baseadas em diferenças biológicas, que justificavam seus interesses de expansão e poder.

Estava criado o racismo etnocêntrico, fundamentado em doutrinas bíblicas, filosóficas e científicas que não resistiram à evolução dos tempos, mas que deixaram marcas indeléveis e profundas nas sociedades que as usaram para justificar a escravidão, como é o caso da sociedade brasileira.

O Racismo Invisível no Brasil

No final do século XIX, com a abolição da escravatura e ainda sob forte influência das teses de superioridade europeia, começa a ser colocado em prática um projeto de construção de uma nova nação brasileira, que deveria ser melhorada através do “embranquecimento” de seu povo.

Algumas décadas mais tarde, esta teoria lugar à da miscigenação, que acabou criando um dos mitos mais prejudiciais à luta contra o racismo: o mito da democracia racial. Foi ele que, durante décadas, impediu o Brasil de se tornar um país realmente democrático, com tratamento e oportunidade iguais para todos, ao negar reconhecimento a um problema que atinge mais da metade da nossa população.

Mas até hoje pessoas preferem dizer que não existe racismo no país (o pior cego é aquele que não quer ver). Telegramas entre diplomatas americanos e o governo dos Estados Unidos que o site Wikileaks vem vazando, dizem o contrário. Em um pacote de 25 telegramas da embaixada dos Estados Unidos em Brasília e do consulado em São Paulo redigidos entre 2004 e 2009, diplomatas americanos informaram ao seu governo que “Muitos (brasileiros) alegam que o racismo não existe, apesar das evidências esmagadoras do contrário“.


Provavelmente, os americanos, um dos povos mais racistas do mundo, fazem referência ao livro do diretor de jornalismo Ali Kamel: “Não somos racistas”. No livro, publicado em 2006 pela Nova Fronteira, o autor garante que não há discriminação racial no Brasil e que todos vivem em harmonia.

Escrito em plena batalha pela implantação das cotas nas universidades, o livro serviu como instrumento da direita para combater as políticas do governo Lula. Para o jornalista, o racismo não teria peso na cultura nacional e não contaria com o aval das instituições públicas e privadas. Nesse sentido, teorizava o autor, a implantação das cotas raciais teria um efeito inverso, negativo, estimulando o racismo. Eu particularmente tenho um outro ponto de vista para esta questão, mas seria assunto para outro post.

O Racismo no Inconsciente

Se hoje já se admite que o Brasil é um país racista, é preciso admitir também que nossos pensamentos e atitudes são condicionados por essa cultura e essa ideologia racista, pois crescemos introjetando e reproduzindo o que já está estabelecido socialmente.

Um estudo mostrou que as crianças são abertamente preconceituosas, e que essa característica perde força a partir da maturação das estruturas cognitivas que permitem que ela deixe de julgar as pessoas com quem se relaciona apenas pela aparência e passe a levar em conta conceitos como bondade ou amizade.

Mostrou também que o racismo, longe de desaparecer com a idade e a necessidade de socialização, caso não haja nenhuma iniciativa por parte de pais e/ou educadores, é introjetado e velado pelo aprendizado das normas sociais vigentes, passando a se manifestar de forma indireta e, em muitos casos, inconsciente.

Imperativos para o Crescimento Econômico

No mundo atual as forças globais emergentes concorrem para moldar o futuro. Algumas forças ameaçam dividir, empobrecer e criar "vencedores" e "perdedores", enquanto outras acenam com possibilidades de um futuro em que a inclusão torne-se uma necessidade econômica e prática para servir ao bem comum.


Não temos outra alternativa senão combater os efeitos negativos e tirar proveito dos aspectos positivos. Na economia global, a pobreza, a falta de saúde, o desemprego e a falta de acesso à escola para os indivíduos (negros e outros segregados em sua maioria) são obstáculos que atrasam a realização das metas do desenvolvimento nacional.

Estimativas recentes sugerem que Brasil, África do Sul e Estados Unidos poderiam ganhar um aumento conjunto de produtividade econômica equivalente ao Produto Interno Bruto (PIB) da 15a maior economia do mundo, se eliminassem a discriminação racial.

Cada uma das nações precisa dos talentos e habilidades dos negros e de outras pessoas menos favorecidas para poder competir efetivamente por investimentos e crescimento econômico no mercado global.

Fontes consultadas:

Artigo
Reportagem

sexta-feira, 29 de maio de 2020

Tramontina: O Porteiro de Puteiro que se Tornou um dos Maiores Empresários do Brasil

Embrenhado nos cafundós do Judas, num lugar de difícil aceso e  retirado a dois dias de mula do centro comercial mais próximo, existia um pequeno povoado, de moradores muito humildes, lugar esquecido e de pouco interesse dos políticos, cuja única fama, que mais o denegria do que o exaltava, era a existência de um puteiro que recebia homens de toda a região.

Foi neste ambiente caboclo que nasceu Valentin, um gauchinho filho de mãe solteira, que logo após o nascimento a mãe veio a falecer. O rebento foi adotado por compaixão pelas prostitutas colegas de labuta da mãe falecida. O menino cresceu e, criado neste fim de mundo em ambiente tão adverso, não recebeu das mães de criação a possibilidade de frequentar uma escola. Assim, não aprendeu a ler nem escrever e já rapaz não aprendeu outra atividade ou profissão senão servir de guarda na portaria da pequena casa de diversão.

Um dia, entrou como novo gerente do puteiro um sujeito cheio de ideias, e assim decidiu modernizar o estabelecimento. Planejou as mudanças e chamou os funcionários e funcionárias para passar as novas instruções. Ao porteiro disse:

– A partir de hoje, o senhor, além de ficar na portaria, vai preparar um relatório semanal onde registrará a quantidade de clientes e seus comentários e reclamações sobre nossos serviços.
– Eu adoraria fazer isso, senhor. Mas eu não sei ler nem escrever!
– Ah! Quanto eu sinto! Mas se é assim, já não poderá seguir trabalhando aqui.
– Mas senhor, não pode me despedir, eu trabalhei aqui a minha vida inteira, não sei fazer outra coisa.
– Olhe, eu compreendo, mas não posso fazer nada pelo senhor. Vamos dar-lhe uma boa indenização e espero que encontre algo que fazer. Eu sinto muito e que tenha sorte.

Sem mais nem menos, deu meia volta e foi embora. O porteiro sentiu como se o mundo desmoronasse. Que fazer? Lembrou que no prostíbulo, quando quebrava alguma cadeira ou mesa, ele a consertava, com cuidado e zelo. Pensou que esta poderia ser uma boa ocupação até conseguir um emprego. Mas só contava com alguns pregos enferrujados e um alicate mal conservado. Usaria o dinheiro da indenização para comprar uma caixa de ferramentas completa.

Como o povoado não tinha casa de ferragens, deveria viajar dois dias em uma mula para ir ao povoado mais próximo para realizar a compra. E assim o fez. No seu regresso, um vizinho bateu à sua porta:

– Venho perguntar se você tem um martelo para me emprestar.
– Sim, acabo de comprá-lo, mas eu preciso dele para trabalhar … já que..
– Bom, mas eu o devolverei amanhã bem cedo.
– Se é assim, está bom.

Na manhã seguinte, como havia prometido, o vizinho bateu à porta e disse:

– Olha, eu ainda preciso do martelo. Porque você não o vende para mim?
– Não, eu preciso dele para trabalhar e além do mais, a casa de ferragens mais próxima está a dois dias de viagem sobre a mula.
– Façamos um trato – disse o vizinho.

Eu pagarei os dias de ida e volta mais o preço do martelo, já que você está sem trabalho no momento. Que lhe parece?

Realmente, isto lhe daria trabalho por mais dois dias…. aceitou.Voltou a montar na sua mula e viajou.
No seu regresso, outro vizinho o esperava na porta de sua casa.

– Olá, vizinho. Você vendeu um martelo a nosso amigo.

Eu necessito de algumas ferramentas, estou disposto a pagar-lhe seus dias de viagem, mais um pequeno lucro para que você as compre para mim, pois não disponho de tempo para viajar para fazer compras.Que lhe parece?

O ex-porteiro abriu sua caixa de ferramentas e seu vizinho escolheu um alicate, uma chave de fenda, um martelo e uma talhadeira. Pagou e foi embora. E nosso amigo guardou as palavras que escutara: ‘não disponho de tempo para viajar para fazer compras’.

Se isto fosse certo, muita gente poderia necessitar que ele viajasse para trazer as ferramentas. Na viagem seguinte, arriscou um pouco mais de dinheiro trazendo mais ferramentas do que as que havia vendido. De fato, poderia economizar algum tempo em viagens. A notícia começou a se espalhar pelo povoado e muitos, querendo economizar a viagem, faziam encomendas.

Agora, como vendedor de ferramentas, uma vez por semana viajava e trazia o que precisavam seus clientes. Com o tempo, alugou um galpão para estocar as ferramentas e alguns meses depois, comprou uma vitrine e um balcão e transformou o galpão na primeira loja de ferragens do povoado.

Todos estavam contentes e compravam dele.Já não viajava, os fabricantes lhe enviavam seus pedidos. Ele era um bom cliente. Com o tempo, as pessoas dos povoados vizinhos preferiam comprar na sua loja de ferragens, a ter de gastar dias em viagens.

Um dia ele lembrou de um amigo seu que era torneiro e ferreiro e pensou que este poderia fabricar as cabeças dos martelos.E logo, por que não, as chaves de fendas, os alicates, as talhadeiras, etc… E após foram os pregos e os parafusos… Em poucos anos, nosso amigo se transformou, com seu trabalho, em um rico e próspero fabricante de ferramentas.

Certo dia decidiu doar uma escola ao povoado. Nela, além de ler e escrever, as crianças aprenderiam algum ofício. No dia da inauguração da escola, o prefeito lhe entregou as chaves da cidade, o abraçou e lhe disse:

– É com grande orgulho e gratidão que lhe pedimos que nos conceda a honra de colocar a sua assinatura na primeira página do livro de atas desta nova escola.
– A honra seria minha – disse o homem. Seria a coisa que mais me daria prazer, assinar o livro, mas eu não sei ler nem escrever, sou analfabeto.
– O Senhor?!?! – Disse o prefeito sem acreditar. O senhor construiu um império industrial sem saber ler nem escrever? Estou abismado. Eu pergunto:
– O que teria sido do senhor se soubesse ler e escrever?
– Isso eu posso responder. – Disse o homem com calma.
Se eu soubesse ler e escrever… ainda seria o PORTEIRO DO PUTEIRO!!!

Lição desta história:  Geralmente as mudanças são vistas como adversidades e obstáculos, principalmente quando estamos em zonas de conforto. Mas estas adversidades podem ser bênçãos. As crises estão cheias de oportunidades. Se alguém lhe fechar as portas, não gaste energia com o confronto, procure janelas para abrir.

Valentin Tramontina: O Porteiro do Puteiro

 

Essa história é atribuída a um grande industrial chamado Valentin Tramontina, fundador da Tramontina, que hoje tem 7.000 empregados e produz 18.000 itens que vão desde colheres de mesa a sofisticadas ferramentas e exporta para mais de 120 países. A cidadezinha é Carlos Barbosa e fica no interior do Rio Grande do Sul.

valentin tramontina porteiro de puteiro

Quase todo mundo que lê este conto fica emocionado e inspirado com a história de superação e sucesso do protagonista. Mas esta bela história é fantasiosa e foi elaborada por alguém para dar uma lição motivadora. Valentin nunca foi porteiro de prostíbulo. Era um colono artesão, oriundo de Santa Bárbara, interior do município de Bento Gonçalves, filho da imigrantes italianos da aldeia de Poffabro, município de de Frisanco, na região do Friuli-Venezia Giulia, nordeste da Itália.

Tramontina

 

A história da Tramontina começa em 1911, quando Valentin Tramontina chega à cidade de Carlos Barbosa, no Rio Grande do Sul, para montar o seu próprio negócio. Das mãos deste filho de italianos, natural de Santa Bárbara (RS), nasce a ferraria Tramontina: uma pequena oficina estabelecida em um terreno alugado.

Após cumprir o serviço militar obrigatório, Valentin retoma suas atividades e investe no futuro, transferindo a empresa para um galpão maior. Terra e mata, algum instrumento de trabalho, foi o início do barraco provisório, do esquartejo do pinheiro, da derrubada da mata, da construção da casa definitiva, dos cercados, galpões e as plantações.

Para o imigrante que deixou a Itália no final do século 19, o principal anseio era a propriedade da terra. O contato com a Revolução Industrial ocorrido na Europa foi de grande valia para o colono italiano. O trabalho na fábrica, ainda que temporário, o familiarizou com o novo modo de produzir. Algumas máquinas, fruto da revolução industrial, foram trazidas pelos imigrantes.

Saber como as máquinas eram produzidas era um atalho para a produção de novas ferramentas e artefatos. Tudo o que escrevemos até agora é para dizer que a família Tramontina tinha em seu sangue o destemor da maioria dos imigrantes que aportaram nessa região inóspita e ingrime do estado mais meridional do Brasil.

Ao chegar na região colonial do Rio Grande do Sul, o imigrante trazia o conhecimento de algumas atividades e as precondições para a produção de outras. Eram extremamente engenhosas.Um córrego, a ser canalizado, em todo ou em parte, foi a grande engenhosidade dos imigrantes. A roda d’água foi o embrião da metalurgia da região.

Valentin Tramontina, em 1911, montou sua ferraria na então vila de Carlos Barbosa. A família de Valentin morava em Santa Bárbara, localidade pertencente ao município de Bento Gonçalves, atualmente fazendo parte do município de Monte Belo do Sul, e lá fabricava ferramentas agrícolas.

Valentin veio a Carlos Barbosa porque a chegada da ferrovia significava perspectiva de expansão. Até 1930, a produção da ferraria era modesta. Valentin prestava serviços a empresas, entre elas Arthur Renner, proprietário de uma refinaria de banha, onde eram abatidos mais de 150 suínos por dia. Fazia consertos nas empresas e fabricava facas e canivetes. Podia ser considerado um ferreiro urbano.

Em 1924, a empresa de Arthur Renner se transfere para Montenegro. A partir de então, ocorrem algumas mudanças na linha de produção. O tradicional cabo de madeira das facas e canivetes é substituído pelo cabo de chifre, e vários modelos são lançados, entre eles um denominado "Santa Bárbara".

fabrica tramontina

Em 1932, Valentin agrega os primeiros colaboradores. São pessoas que residem na vila, trabalham na agricultura em tempo parcial e começam a fazer facas e canivetes nos porões de suas casas.

Valentin Tramontina, nascido em 1893, falece com 46 anos de idade, no ano de 1939. A partir daí, assume a ferraria, dona Elisa Tramontina, esposa de Valentin, que desponta como uma empreendedora nata e arrojada. Ela é quem embarca no trem da estação da vila de Carlos Barbosa e vai vender a produção nos mercados regionais e na capital do Estado.

Durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), caso não existisse a determinação e a coragem de Elisa, a ferraria teria sucumbido.

O ano de 1949 pode ser considerado um marco na história do Grupo. Trata-se da data em que Ruy José Scomazzon, barbosense de 20 anos, amigo de Ivo Tramontina, cursando a Faculdade de Ciências Econômicas da PUC – Porto Alegre, começa a prestar assessoria à Tramontina. Ruy, com espírito de liderança, implanta planos ambiciosos, enfatizando a organização em todos os setores. Inaugura-se uma nova etapa. O caráter artesanal dá lugar a uma produção manufatureira.

Na década de 50, a empresa contava com 30 empregados e alguns representantes comissionados espalhados pelo Estado.

Os canivetes representavam 90 por cento do faturamento. Vem da Itália a tradição de ter no bolso um canivete, cuja denominação é "brítola". Trata-se de um canivete com formato de pequena foice utilizado principalmente na poda da parreira, para cortar vime. A Tramontina sempre se destacou na fabricação deste canivete. A empresa se capitaliza rapidamente, com inovações tecnológicas: laminadores, marteletes, máquinas de esmerilhar e forjar, que dinamizam a produção em série.

Com a presença do governador Ildo Meneghetti, em dezembro de 1956, foi inaugurada a ampliação das instalações da empresa e o novo escritório. Intensifica-se a produção de facas e ferramentas agrícolas. O ano de 1958 marca a fundação da Metalúrgica Forjasul, em Porto Alegre, e posteriormente transferida para Canoas.

Em 1961 falece a grande baluarte Elisa Tramontina. As décadas de 60 e 70 são marcadas pela instalação de empresas do Grupo em Garibaldi, Farroupilha e na Bahia, e também pela admissão de novos empregados.

A história de sucessão começou em 1949, quando Ivo Tramontina seguiu os passos do pai e passou a comandar o negócio, junto com seu amigo, Ruy J. Scomazzon. Nas décadas seguintes, a dupla foi responsável por expandir o empreendimento e levar a Tramontina para cerca de 120 países.

A tradição da família continuou quando Clóvis Tramontina, filho de Ivo, deu sequência aos negócios, assumindo, em 1992, a presidência da companhia. Mas ele não caiu de paraquedas no cargo. Antes de alcançá-lo, foi preparado para isso. Passou por vários setores da empresa e estudou, se formando em Administração e fazendo alguns outros cursos depois, como pós-graduação e MBA.

loja tramontina

Houve um salto gigantesco. Dos 30 empregados existentes em 1950, a empresa passou a ter em seu quadro 557 funcionários no final dos anos 60. Hoje o Grupo emprega quase 7.000 pessoas, exporta para mais de 120 países e é uma marca conhecida no mundo inteiro. Nas suas 10 unidades produz mais de 18 mil itens. A organização das fábricas se dá da seguinte forma:

  1. Tramontina Belém, localizada na cidade de Belém/PA, produz móveis de madeira para áreas internas e externas, utilidades domésticas e cabos para ferramentas.
  2. Tramontina Cutelaria, localizada na cidade de Carlos Barbosa/RS, produz facas de cozinha, profissionais e esportivas, utensílios de cozinha, talheres para uso diário, panelas, frigideiras, formas e assadeiras, tesouras, potes plásticos, uma linha infantil e uma linha de produtos e acessórios para churrasco.
  3. Tramontina Delta, localizada na cidade de Recife/PE, produz mesas, cadeiras, brinquedos, estantes, vasos, lixeiras, caixas organizadoras, gaveteiros e poltronas de plástico injetado ou rotomoldado.
  4. Tramontina Eletrik, localizada na cidade de Carlos Barbosa/RS, produz tomadas, interruptores, disjuntores, duchas, extensões, conduletes, acessórios para eletrodutos, aparelhos à prova do tempo, iluminação, injeção de alumínio sob encomenda e produtos para atmosferas explosivas.
  5. Tramontina Farroupilha, localizada na cidade de Farroupilha/RS, produz panelas, talheres e uma linha para servir de aço inoxidável, cozinhas profissionais e eletroportáteis.
  6. Forjasul Canoas, localizada na cidade de Canoas/RS, produz morsas, machados, marretas, ganchos para içamento de cargas, forjados sob encomenda e ferragens eletrotécnicas para linhas de transmissão e subestações de alta e extra-alta tensão e para redes aéreas de distribuição de energia elétrica.
  7. Tramontina Garibaldi, localizada na cidade de Garibaldi/RS, produz ferramentas industriais e organizadores metálicos para o setor industrial e automotivo, ferramentas profissionais para a construção civil e ferramentas manuais para uso doméstico.
  8. Forjasul Madeiras, localizada na cidade de Encruzilhada do Sul/RS, produz painéis de pinus, prateleiras retas e de canto, estantes e utilidades domésticas.
  9. Tramontina Multi, localizada na cidade de Carlos Barbosa/RS, produz equipamentos dirigíveis, ferramentas e equipamentos para jardinagem, agricultura e construção civil.
  10. Tramontina TEEC, localizada na cidade de Carlos Barbosa/RS, produz tanques, pias/cubas, coifas, cooktops, fornos, lixeiras, cachepôs e acessórios.

Fonte



domingo, 10 de maio de 2020

A Filosofia do Chaves: Não Tenha Nada para não Ter Nada a Perder! Só Assim Você Será Livre.

Um tema pelo qual tenho me interessado muito é a Intersubjetividade: a capacidade do homem de se relacionar com o seu semelhante. Jean-Paul Sartre resumiu seu ponto de vista sobre este assunto em uma frase presente na sua peça de teatro Entre Quatro Paredes: “o inferno são os outros”.

Para Sartre, a principal característica do homem é a sua liberdade fundamental. Sendo assim, mesmo alguém mantido sob a pior forma de dominação, no fundo permanece livre em seu ser, em sua consciência. Em outras palavras, um homem jamais conseguirá dominar completamente o outro.

Isto explica, em parte, porque as relações humanas são em geral conflituosas: na presença do outro há um confronto entre minha liberdade e a dele. E porque o outro também é livre, não podemos controlar o que ele pensa e o que ele nos diz. Porém, ao mesmo tempo preciso dele, de seu olhar crítico, ainda que, muitas vezes, esse olhar veja algo em nós que não gostamos.

Esta questão da liberdade dos indivíduos me remete a uma entrevista que vi recentemente no Youtube do Mario Sérgio Cortella. Neste vídeo, o professor discorreu sobre o conceito de ética e liberdade fazendo um paralelo com o seriado Chaves. Irei transcrever na íntegra a sua fala para que o leitor não perca nenhum detalhe:

"No contexto da discussão sobre ética. Você tem que lembrar que o Chaves, o personagem da TV, ele é alguém que se inspirou num pensador clássico chamado Diógenes. Diógenes foi um filósofo grego pós-socrático que morava num barril. Tal como Sócrates viveu solto na praça, discutindo, e o Chaves mora num barril, Diógenes, que era um alguém da escola cínica na Filosofia, morava num barril e vivia nu. Aliás, porque ele não tinha propriedade alguma pra não ser propriedade de nada. Se você já observou na série “Chaves”, ninguém tem animal de estimação naquela vilinha, porque o único ser ali que é um animal de estimação é o próprio Chaves. Segundo, é o único que é livre, o único que pode dizer o que quer, ele não tem nada a perder."


O Cortella só cometeu um pequeno equívoco pois o Chaves não mora no barril segundo palavras dele mesmo:

"Eu não moro no barril, eu só entro no barril porquê... bem, você sabe... pra... "
"Só por esporte."
"Isso!"
(Diálogo entre Chaves e Kiko)


Bom fim de semana a todos!

Ah, abaixo a entrevista citada...

terça-feira, 31 de março de 2020

Quanto Preciso Poupar para Aposentar?

Considerando que precisarei de 2 mil dólares por mês para viver dignamente bem na minha idade senil e considerando que irei iniciar minha poupança para aposentadoria no dia de hoje aos 45 anos (não é o caso mas estou apenas fazendo um exemplo didático), considerando também que não quero deixar dinheiro para herdeiros (ficarão apenas com os bens - o que já está de bom tamanho), e considerando que viverei até os 100 anos, então a planilha é a seguinte:

Idade Poupança em Dólares
45 24000
46 48000
47 72000
48 96000
49 120000
50 144000
51 168000
52 192000
53 216000
54 240000
55 264000
56 288000
57 312000
58 336000
59 360000
60 384000
61 408000
62 432000
63 456000
64 480000
65 504000
66 528000
67 552000
68 576000
69 600000
70 624000
71 648000
72 672000
73 648000
74 624000
75 600000
76 576000
77 552000
78 528000
79 504000
80 480000
81 456000
82 432000
83 408000
84 384000
85 360000
86 336000
87 312000
88 288000
89 264000
90 240000
91 216000
92 192000
93 168000
94 144000
95 120000
96 96000
97 72000
98 48000
99 24000
100 0

Ou seja, preciso poupar 24 mil dólares por ano até completar 72 anos. Depois disto é só ir sacando 24 mil dólares por ano até os 100 anos de idade.

Me conte aí qual é a sua estratégia para aposentadoria. Dividendos de ações? Aluguel de imóveis? Tesouro Direto?

Depois desta crise aprendi que "cash is king!" rs


terça-feira, 4 de fevereiro de 2020

Planilhas de Controle: Uma Hora Você Não Vai mais Precisar Delas

Eu já fui o rei das planilhas, era assim que minha esposa me chamava quando me conheceu. Eu tinha planilha para tudo, de controle de gastos a controle do crescimento do filho. Mas já tem uns dois anos que eliminei todas as planilhas da minha vida. Minto, sobrou apenas uma: a de rendimentos para fins de imposto de renda.


No inicio da minha vida adulta a planilha de controle de gastos se tornou indispensável para minha reorganização financeira. Era uma planilha bem detalhada (veja aqui), e me divertia em controlar até os centavos que deixava para o flanelinha.

Depois vieram as planilhas de controle de rendimentos. Meu Deus, eu ficava ansioso para a chegada do último dia do mês para fazer o famoso "fechamento mensal". E foi por isto que criei este blog anos atrás, para divulgar meus fechamentos e participar de rankings de rentabilidade. Também era muito divertido fazer aquilo, até ver que isto não passa de um "game" sem sentido.

E chegou um dia que não vi mais necessidade para fazer estes controles. Chega-se em um ponto da vida que você entra em modo "voo de brigadeiro". Para de sentir turbulências, e a única coisa que precisa é ligar o piloto automático.

Se me perguntar quando gastei nos últimos dois anos... não sei. Se me perguntar qual foi minha rentabilidade de investimentos nos últimos dois anos... também não sei. E quer saber? Isto não faz mais a menor diferença para mim.

Mas caso você esteja iniciando sua vida financeira, caso não tenha nenhuma ideia para aonde seu dinheiro está indo, recomendo fortemente que tenha pelo menos uma planilha de controle de gastos, e torne sistemático o hábito de registrar suas despesas e rendimentos até o momento que sua vida entrar em piloto automático e não precisar mais daquilo.

sexta-feira, 24 de janeiro de 2020

FIRE e a Sua Geração de Valor

Na finansfera agora só se fala de FIRE, para quem não conhece o termo, significa "Financial Independence and Retirement Early". Basicamente é se aposentar o mais cedo possível após conquistar a independência financeira.

O que venho chamar atenção aqui é para o "RE", isto é, a aposentadoria antecipada. O "FI" está OK, todo mundo deve buscar a independência financeira, mas a busca do "RE" pode dar um nó na cabeça do indivíduo se não for bem trabalhada.

Geralmente as pessoas buscam a aposentadoria antecipada simplesmente porque detestam o seu trabalho. Ou até gosta da profissão escolhida mas a mesma é tão desgastante que não vale a pena os benefícios em função do custo.

Poderia vir aqui com aquele papinho de que você deve procurar uma atividade que ama pois assim seu trabalho torna-se prazeroso. Mas não é assim, mais cedo ou mais tarde a atividade tão amada torna-se também enfadonha e maçante.

Também não vejo com bons olhos o indivíduo gastar tanto tempo de estudos e especializações para aprender fazer algo na vida e de repente jogar toda aquela bagagem fora. Estamos aqui falando de geração de valor.

Basicamente nossa vida é uma troca de valores entre pessoas. Cada um tem sua potencialidade e a usa para gerar valor para as outras pessoas. Se você gerar muito valor irá receber dinheiro em troca disto. Usará então este dinheiro para extrair valor de outras pessoas. Irá acumular parte deste dinheiro para, no futuro, ainda continuar obtendo valores das pessoas quando você não mais tiver condições de gerar valor.

O meu alerta está neste período em que você já conquistou a independência financeira mas ainda tem plenas capacidades de continuar gerando valor para as outras pessoas. Se você simplesmente parar de gerar valor poderá ter sérios problemas psicológicos.

Gerar valor é umas das coisas mais gratificantes para o ser humano, além de ser importantíssimo para manter a sanidade mental. Use para isto suas potencialidades, seus aprendizados de vida. Todo mundo é muito bom em algo, e esta potencialidade não pode ser desperdiçada, mesmo que você já atingiu o "FI", pense bem a respeito do "RE".

Termino este post deixando a dica de um excelente documentário que tem no Netflix sobre o sushiman mais famoso do Japão. Para comer um sushi lá você precisa entrar em uma fila de espera de 3 meses. A potencialidade deste japones é fazer o melhor sushi do mundo, é nisto que ele é muito bom, esta é a sua bagagem de vida. Este é o valor que ele gera para as outras pessoas.

No subsolo de uma estação de metrô em Tóquio trabalha o maior e mais renomado Sushiman do Japão, Jiro Ono, que com seus 85 anos ainda cuida diariamente de seu restaurante o Sukibayashi Jiro. Este documentário retrata de forma magnífica a história, desafios e a busca incessante pelos melhores ingredientes e o aprimoramento da arte de fazer sushi. Por que um simples sushi de arroz e peixe produzido por este homem, tem um nível de qualidade tão grande que possa chamar a atenção dos maiores chefs do mundo?